quinta-feira, 9 de setembro de 2010

A violência contra a mulher é um problema de todos nós...


Venho refletindo sobre a violência doméstica em meus textos há um bom tempo, em um determinado período também não me via como feminista, pois como o senso comum achava que era o oposto do machismo,não queria "ser mal vista", não queria ser feminista, mas estudando e refletindo, sou sim feminista, ainda que não nos moldes franceses, mas sobre a ótica do intitulado feminismo negro tão bem colocado com Lélia Gonzales, Sueli Carneiro, Jurema Werneck...lendo uma matéria recente publicada na Revista São Paulo, sobre as mulheres presidiárias no Carandiru Feminino, li um depoimento de uma mulher que mandou matar o marido, pois chegou no seu limite, após ter sido espancada por diversas vezes por seu companheiro e ela suportou não sabemos os motivos, mas ele chegou ao ponto de cortar a orelha do seu filho. Este foi o click para que ela mandasse acabar com a vida dele e dela, ela foi condenada a 36 anos de prisão. Ontem declamei o meu novo texto sobre a temática "Em legítima defesa", no Sarau da Cooperifa e um dos poetas, amigo meu, chegou no meu ouvido e disse: - Elizandra, depois deste poema você vai morrer solteira!... Ele falou algo que me chamou a atenção, como se o problema da violência doméstica fosse singular e não plural...vejo a necessidade de explicar o poema antes de redigi-lo, pois não é a revanche que queremos, queremos justiça, mas se ela não acontecer enquanto ainda estamos sendo espancadas e ficando caladas, ela vai se manifestar de outra forma...E não queremos isso, queremos que a luta pelo fim da violência doméstica seja tratada com mais seriedade...Não é um problema da Elizandra, é um problema da sociedade como um todo...Não somos objetos e nem mercadorias, somos seres humanos...




Em Legítima Defesa
Por Elizandra Souza

Estou avisando, vai mudar o placar....
Já estou vendo nos varais os testículos dos homens que não sabem se comportarem
Lembra da Cabeleireira que mataram outro dia?
E as pilhas de denuncias não atendidas
Que a notícia virou novela e impunidade
É mulher morta nos quatro cantos da cidade...


Estou avisando, vai mudar o placar...
A manchete de amanhã terá uma mulher de cabeça erguida dizendo:
- Matei! E não me arrependo!
Quando o apresentador questiona-lá ela simplesmente retocará a maquiagem.
Não quer esta feia quando a câmera retornar e focar em seus olhos, em seus lábios...


Estou avisando, vai mudar o placar...
Se a justiça é cega, o rasgo na retina pode ser acidental
Afinal, jogar um carro na represa deve ser normal...
Jogar a carne para os cachorros procedimento casual...


Estou avisando, vai mudar o placar...
Se existe algo que mulher sabe fazer é vingar
Talvez ela não mate com as mãos mais mande matar..
Talvez ela não atire, mas sabe como envenenar...
Talvez ela não arranque os olhos, mas sabe como cegar...

Só estou avisando, vai mudar o placar...


12 comentários:

A disse...

ótima reflexão, belíssimo poema...
Forte e real!

Jaqueline disse...

Caralho, adorei... Você está cada dia mais foda com essas poesias.
Parabéns preta.
E você não vai morrer solteira por causa disso, os problemas são outros, e antes ter dignidade do que ficar calada.
Abs

Luciana Dias disse...

Infelizmente temos um longo caminho pela frente, pois se até em espaços em que seria possível encontrar interlocutores com um pouco de sensibilidade somos obrigadas a ouvir este tipo de piadinha...
Por isso me pergunto: quem são os verdadeiros nesta luta? Enquanto não encontro resposta prefiro ficar no meu cantinho observando...Mas admiro sua persistência e coragem de estar! Parabéns beijos

Jéssica Balbino disse...

*Este texto, Elizandra, é a prova de que o placar já mudou. Se antes tínhamos medo de falar, hoje, homem nenhum consegue nos calar. Além de ser um belo poema, é ainda o desabafo de uma parte da sociedade que cansou de viver subjulgada por seres que se acreditam superiores. Muitos homens, vão sim, reclamar e da mesma maneira que, a vida toda, oprimiram as mães, irmãs e companheiras, vão tentar fazer conosco, guerreiras e militantes, mas, eles não sabem, que neste jogo, já chutamos pro gol há muito tempo e que o placar já marca a nosso favor, independente do juiz que apita. O grito da torcida vai mais longe e contagia. Amanhã, estaremos nas capas dos jornais, rindo, com a maqueagem intacta. Na bagagem, o sofrimento amassado e no coração o desejo de nunca mais ceder. É...sinto muito, homens, mas é assim que vai ser !!!

Migh Danae disse...

Acredito na força das palavras. Muitos homens também acreditam. E passam anos machucando esposas, namoradas, com palavras. E isso precisa ser dito por que muitos homens e muitas mulheres só consideram agressão aquela que é feita quando se bate, no rosto, marca no corpo.
A Lei Maria da Penha prevê todo e qualquer tipo de agressão
(http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm), e, apesar de não ser "perfeita", já que nenhuma lei é, é o que temos e que nos protege bastante de loucuras tais.
Mas eu acredito também que a força das palavras pode ser usada para combater essa mesma agressão, essa violência presente no cotidiano, nas durezas da vida. Ontem presenciei no ônibus uma situação assim: uma garota reclamava para o seu parceiro que ele tinha sido grosso com ela, e ela então repetia o que ele tinha dito, e ele ria, repetindo novamente o que tinha dito, para mostrar para ela que não havia sido grosso.
Os dois estavam falando as mesmas coisas, mesma língua, mas não se entendiam! E ela "parecia" histérica, ele "parecia" divertido, aos olhos do pessoal no ônibus. Sei bem que sensação é essa, pois tive um namorado que simplesmente me dava as costas e fazia cara de muxoxo na frente de todo mundo quando não queria mais conversar. E para ele isso era uma "grande bobagem", mas, com certeza, se eu fizesse o mesmo, seria "desrespeito".
Assim como o rap, a poesia do combate que mais conhecemos, essa poesia quer dizer isso, quer dizer o que muitas vezes não podemos dizer, que dizer o que sentimos quando somos machucadas, detonadas, destruídas... matar o opressor, matar o machismo, matá-lo mesmo dentro de nós.
É isso que precisamos! Parabéns pela poesia, mulheres de todo o mundo precisam mais e mais da força dessas palavras... e homens precisam mais e mais compreender que quando falamos da luta contra a agressão e contra o machismo, não estamos falando contra a relação heterossexual.

Migh Danae disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Daniela Gomes disse...

Muito bom o post e melhor ainda o poema Elizandra. É impressionante como cada dia mais os noticiários estão cheios de notícias sobre violência contra mulher e há sempre uma "razão" para que esta se justifique, seja o comportamento sexual da envolvida, ou qualquer outra desculpa esfarrapada.
O medo de deixar de ser feminina, faz com que muitas de nós não pense em ser feminista e esqueça de seus direitos e de apoiar aquelas que são o nosso reflexo.
Parabéns pela reflexão e pelo trabalho.

dils santos disse...

puts terrivel vcs em pleno seculo 21 sofrerem caladas!!!!

DEUSA PAGÃ disse...

A batata tá assando!!!
E quem olhar torto é pq tem culpa no cartório ou vai dormir com um olho aberto e outro fechado.!!!
rsrsrsr
Mulheres unidas pelo fim da violência!!!

Rose disse...

Vc ta cada vez melhor minha flor! é isso mesmo a VILOÊNCIA CONTRA MULHER NÃO É UM MUNDO QUE AGENTE QUER!

Anônimo disse...

Oi Li!!

Gosto da sua reflexão, o problema é nosso...é um comportamento arraigado na relação homem X mulher que não deveria ser tolerado, não deveria existir, ainda. Mudamos um pouco esse parâmetro quando nos tornamos LIVRES!!

Falando em liberdade, me mudei!! Tô casada!! Vamos combinar algo.
Bjo, se cuida.

Vanessa Reis

ana rüsche disse...

(não vou dizer que bom mesmo é ouvir na tua voz o poema)
é isso mesmo, elizandra, tem muito o que se andar e se construir, mudar placar. o post é ótimo como vc comentou.
bom te conhecer.