quarta-feira, 24 de março de 2010

O Globo nega-se a publicar anúncio de campanha pró cotas


Mariana Martins – Observatório do Direito à Comunicação 16.03.2010

A negativa do jornal O Globo, no início do mês, em publicar uma peça publicitária da Campanha Afirme-se em defesa das ações afirmativas relacionadas à questão racial recoloca de forma explícita um importante debate acerca do direito à comunicação.
O episódio estabelece uma situação de fato em que liberdade de expressão é confundida com liberdade comercial das empresas privadas de comunicação. A publicação, mais antigo veículo do maior grupo de comunicação do país, alega possuir uma política comercial específica para o que chama “peças de opinião” e, por esta razão, teria mais que decuplicado o valor a ser cobrado pela veiculação do anúncio ao tomar conhecimento de que se tratava de uma campanha pró cotas.

O pesquisador sênior da Universidade de Brasília Venício A. de Lima diz que este é um caso que merece ser observado a partir das diferenças entre liberdade de imprensa e liberdade de expressão. A primeira, na opinião do professor, está relacionada à proteção dos interesses daqueles responsáveis pelos veículos de comunicação e não deve ser confundida com a segunda, que é um direito humano e, no Brasil, constitucionalmente positivado. Lima pondera que a liberdade de expressão, no atual contexto das práticas de comunicação, depende da inserção de opiniões diversas nos grandes veículos de massa. Estes, portanto, precisariam refletir não só a opinião dos seus donos.

No caso da não publicação do anúncio da Afirme-se, o que está colocado é, justamente, a utilização de uma política comercial, justificada supostamente pelo princípio da liberdade de imprensa, para restringir o direito da campanha publicizar sua opinião a favor das ações afirmativas e o direito dos cidadãos de receberem informação sobre o tema desde uma perspectiva diversa da dos veículos das Organizações Globo. Segundo Lima, na página de O Globo na internet, o jornal apresenta a tabela de preços comerciais e nela está escrito que a empresa cobra de 30% a 70% a mais em anúncios de conteúdo opinativo. Contudo, no caso em questão, o valor variou em aproximadamente 1300%.

Curiosamente, a tentativa da Campanha Afirme-se publicar o anúncio está intimamente relacionada ao fato de os grupos a favor das ações afirmativas perceberem que não conseguiam espaço editorial, ou seja, na cobertura jornalística regular para apresentar seu ponto de vista.
Assim, por ocasião da audiência pública no Supremo Tribunal Federal (STF) que discutiria entre os dias 3, 4 e 5 de março duas ações de inconstitucionalidade movidas contra a criação de cotas nas universidades públicas para descendentes de negros e indígenas, a campanha resolveu fazer intervenções publicitárias em jornais de grande circulação nacional em defesa da constitucionalidade das leis que estão em vigor.

A intervenção publicitária produzida pela agência Propeg, que também é parceira da campanha, contava basicamente com três produtos: um manifesto ilustrado que seria publicado em jornais considerados formadores de opinião pelos organizadores da Afirme-se, um spot de rádio e um uma vinheta, que estão disponíveis no blog da campanha.
De acordo com Fernando Conceição, um dos coordenadores da Afirme-se, as doações das entidades que fazem parte da campanha e a captação de recursos com outras organizações foram suficientes para pagar a publicação do manifesto em quatro jornais de grande circulação – O Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo, A Tarde (BA) e O Globo (RJ). “Nós resolvemos comprar especificamente nesses veículos porque eles já vêm fazendo campanhas sistemáticas contra as cotas há tempos. Como nós temos outra visão e não encontramos lugar livremente para expor um outro ponto de vista, resolvemos comprar o espaço”, explica Conceição.

Como é de praxe nas campanhas publicitárias, a agência responsável passou a negociar o preço do anúncio de uma página inteira a ser publicado no dia 3 de março com os veículos selecionados. Por se tratarem de anúncios ligados a Organizações Não Governamentais, os preços acordados ficaram em torno de R$ 50 mil. O valor exato negociado com O Globo foi orçado em R$ 54.163,20.

Valor impraticável
Fechados os valores, a agência enviou a arte ao jornais. Dois dias antes da campanha ser publicada, a coordenação da campanha Afirme-se foi comunicada pela agência Propeg que o anúncio havia sido submetido à direção editorial de O Globo e que os responsáveis julgaram que a peça era “expressão de opinião”. O jornal dizia que, sendo assim, o valor deixava de ser negociado anteriormente e passava para R$ 712.608,00. “Um valor irreal, impraticável até para anuncio de multinacional”, queixa-se o coordenador da campanha.

Procurado pela equipe do Observatório do Direito à Comunicação, o jornal O Globo não respondeu aos pedidos de entrevista. No entanto, o diretor comercial da publicação, Mario Rigon, concedeu entrevista ao portal Comunique-se ao qual disse que considerou a peça da campanha como “expressão de opinião” e diante disso, “seguiu a política da empresa, que determina um valor superior para esse tipo de anúncio”. “De fato vimos que se tratava de uma expressão de opinião, mas não nos cabe julgar o mérito da causa. É a nossa política comercial, tratamos assim qualquer anunciante que queira expressar sua opinião”, disse Rigon ao portal.

Este Observatório também buscou consultar o Conselho de Autorregulamentação Publicitária (Conar). Por intermédio da assessoria de imprensa, o conselho adiantou que não tem posição sobre o caso, visto que foge do escopo da entidade se posicionar sobre a política comercial dos veículos. “Nós não nos posicionamos sobre regulação de mídia exterior, atuamos exclusivamente sobre o conteúdo das mensagens publicitárias”, disse Eduardo Correia, assessor de Imprensa do Conar. O assessor falou ainda que a entidade precisa ser provocada por processos para se posicionar sobre o conteúdo de uma peça e que nas questões de política comercial das empresas eles não devem opinar.

Ainda analisando o caso, o pesquisador Venício Lima lembra que, diante da falta de regulamentação da mídia no Brasil, as empresas privadas, na maioria das vezes, podem agir como bem entendem e praticar os preços que lhes convêm. Lima acredita ainda que seja provável que O Globo esteja, a partir da lógica comercial, protegido legalmente para fazer esse tipo de cobrança, o que é apenas “um lado da moeda”.

É fato que a liberdade comercial baseia-se na lógica de que as normas podem ser estabelecidas pelas próprias empresas e que, portanto, podem causar distorções quando estas se cruzam com questões editoriais. No caso em questão, fica evidente a falta de transparência quanto aos critérios adotados por O Globo para considerar o anúncio como conteúdo opinativo e aplicar um valor diferenciado. Os outros três jornais que publicaram a peça publicitária não tiveram a mesma compreensão e a tabela aplicada foi a de anúncio publicitário comum.

A Afirme-se move uma ação contra O Globo no Ministério Público do Rio de Janeiro por conta do episódio. A campanha pede que, com base no que diz a Constituição Federal com relação à liberdade de expressão, o jornal seja obrigado a publicar o anúncio por um valor simbólico.
Fernando Conceição defende que a atitude de O Globo foi claramente de abuso de poder econômico e que se configura como dumping, prática condenada pelo próprio mercado. “Foi uma maneira que a direção de O Globo encontrou para cercear o direito constitucional que é a liberdade de expressão por meio do abuso do poder econômico”, denuncia Conceição.

Anticotas
Pesa ainda contra as Organizações Globo como um todo uma constante militância contra as ações afirmativas relativas à questão racial, dentre elas as políticas de cotas para negras e negros nas universidades públicas. Esta militância é liderada inclusive pelo atual diretor da Central Globo de Jornalismo, Ali Kamel. Kamel é autor do livro “Não somos racistas: uma reação aos que querem nos transformar numa nação bicolor”, que nega a existência do racismo e, portanto, da necessidade de políticas reparadoras.

Pesquisa do Observatório Brasileiro de Mídia, citada por Venicio Lima, revela que grandes revistas e jornais brasileiros apresentam posicionamento contrário aos principais pontos da agenda de interesse da população afrodescendente – ações afirmativas, cotas, Estatuto da Igualdade Racial e demarcação de terras quilombolas. A pesquisa analisou 972 matérias publicadas nos jornais Folha de S.Paulo, O Estado de S.Paulo e O Globo, e 121 nas revistas semanais Veja, Época e Isto É – 1093 matérias, no total – ao longo de oito anos.

Lima chama a atenção para o fato de a cobertura de O Globo merecer um comentário à parte na pesquisa. Dentre os três jornais pesquisados, foi aquele que mais editoriais publicou sobre o tema, mantendo inalterados, ao longo dos anos, argumentos que se mostraram falaciosos, como o de que as cotas e ações afirmativas iriam promover racismo e de que os alunos cotistas iriam baixar o nível dos cursos.

Lembrando destes dados da pesquisa, Lima acredita que O Globo estabeleceu uma barreira comercial e que, do ponto de vista legal, eles podem estar cobertos pelos princípios da livre iniciativa. “Mas, esta conduta, tendo em vista o conteúdo que deixou de ser publicado, infringe o direito à informação. A questão que fica para o Ministério Público do Rio de Janeiro é legal. Cabe a eles encontrarem alguma forma jurídica de pensar o caso sob o ponto de vista do direito à informação. Para mim, essa postura deixa as Organizações Globo numa situação difícil para posteriormente falar de liberdade de expressão”, conclui o professor.

Dina Di, esteja na paz!!!!!



Tudo de Mim...Dina Di

Sou guerreira do Rap, linha de frente !
Levo a bandeira no peito, indo valente!

Verdadeiro vencedor, vence o medo, vence a dor... é isso que eu sou !!

É minha vida, é minha canção !

É minha briga é meu mundo jão !

É minha vida é minha verdade !
É uma fonte de oportunidade, terapia anti-solidão !

Mente vazia é a oficina do cão !

Tudo é música poesia, minha dor, minha alegria !

Tudo é música !

É tudo de mim, é tudo de mim !

Tudo é música !
Às vezes eu paro, reparo e fico a pensar...

Qual seria meu destino senão cantar...

É minha vida é algo de valor !
É minha sina é meu grande amor !

Minha rima é minha intimidade... um momento de felicidade !

Tudo é fase, tudo é inspiração...

Tudo é nada sem Deus no coração !

Tudo é música, poesia, minha dor, minha alegria...

Tudo é música.
É tudo de mim, É tudo de mim...
Às vezes eu paro, reparo e fico a pensar...

Qual seria meu destino senão cantar (?)

Sou guerreira do Rap, linha de frente...

Porta bandeira, peito equivalente !

Vim do gueto, anonimato, não tenho preço, MULHER DE FATO !
Eu quero é mais cortar o mal pela raiz !

Eu quero paz e ser feliz !

A minha mente é periférica !...

Maluco eu renasci das cinzas da favela pro mundão Dina Di !
Se eu não acredita em mim o mundo vai duvidar a vida é assim !

Não há nada pior do que a falta de fé... sem Deus, sem chance de fica em pé !

Assim qui é !Já não me sinto tão só na imensidão, ovelha perdida sem luz na escuridão...
Procuro na fonte do conhecimento das águas que curam e regeneram por dentro !




quinta-feira, 11 de março de 2010

Sapato Vermelho


Andando sobre os paralepipedos, Flora exibia extravagantemente os seus sapatos vermelhos, modelo scarpin, salto 15 cm. Mas embriagada em sua própria vaidade pisou numa caixa recheada com cimento fresco e seu sapato ficou preso nela.

Ao olhar ao redor, percebeu que estava diante de uma sapataria.

_Graças à Deus! Não ficarei sem ir à apresentação de dança, agradeceu Flora.

Ao entrar na sapataria.

_Boa tarde, Senhora! O que deseja?, perguntou Jorge atrás do balcão.

_Meu sapato ficou preso em uma caixa com cimento e preciso de outro par que combine com o meu vestido.

Jorge só então observou as curvas do pescoço de Flora, desceu pelas alças do vestido branco com flores vermelhas até chegar aos pés, no qual apenas um estava calçado. Ele a admirou em cada detalhe,mas foi interrompido.

_Você tem algum modelo para sugerir?, indagou a moça prendendo entre os dentes uma parte dos lábios.

Jorge pensou, mas não lembrava de nenhum sapato que combinasse com tal bela dama.

_Olha, sapatos que fiquem bonitos com este vestido eu não tenho, mas uma sandália nas cores branca e vermelha ficaria perfeito.Quer experimentar?

Flora esboçou um sorriso desapontado e triste e desabafou:

_ Este sapato é muito especial pra mim,não quero me desfazer.Eu levo a sandália, se você prometer consertar o meu sapato. Pode ser?, sugeriu a moça.

Jorge foi até a prateleira e trouxe o par de sandálias, que sorriam satisfeitas de sair do local.

Flora calçou-as e saiu tão vaidosa como se estivesse com o scarpin vermelho.


*Por Elizandra Souza, produzido hoje na aula de Revista Laboratório.

domingo, 7 de março de 2010

Maré dentro de mim....

*Paraty. Não lembro se esta foto é minha (Elizandra Souza) ou do Renato Cândido.

Estava sentada no meio fio
Passou uma maré agridoce
Batizada de ...
Omare (?)
Oh! Maré (?)
O mar é ....
O vento gaguejou e não entendi ao certo
Véus despencaram sobre o que é o outro
Rótulos rasgados caídos no chão
Palavras confusas, pensamentos embaralhados
Linguagem diversa e confluente
Somos todos um, nas fronteiras do que imaginamos ser
Aprendi a sonhar doces flores
Desejei mar dentro de mim
Cachoeiras desaguando assim como quem só quer partir
Parte de mim, partiu
Mas inteira me tornei
Se terra e mar se completam
Traga ventos, outras marés...
Marés que goste de guaranás
Que fume apenas as brisas dos olhos
Que passei pelo parque, só para caminhar
Lembranças do que é e do que foi
Sede de jogo e de conhecimento
Obrigação – quer palavra mais dura?
Prefiro pisar em areias que movem o mundo
E que em um único segundo
Traga mar aonde eu ir...
Seja no asfalto urbano e penoso
ou nos afluentes dos rios
Não é compromisso que desejo
Gosto de banhar-me de todas as águas
E o mar aonde eu ir...

Elizandra Souza
Fev/2010

quarta-feira, 3 de março de 2010

Vassalagem perdida nos becos



* Elizandra Souza
Não há orixá que dê jeito
Se não tenho fascínio
Peço proteção aos que me regem
Para que nada de mal me aconteça
Nem praga e nem quebranto
Vou até acender uma vela pro meu santo
Para que se esqueça se tenho graça ou encanto
Detesto o fanatismo e elogios
Anjo que me guarda não me deixe só
Prefiro a lucidez dos que ficam quietos
Aos que blasfemam o que não sou
Inventam uma poetisa perfeita
Que passa longe das minhas veias e vestes
Eu rio para disfarçar meu rancor
Detesto parecer o que não sou
Olhos de seca pimenteira
Não me seque, não me queira
Não me cobice, nem me deseje
Sou erva daninha arranque-me de ti..
Procure outro caminho que eu não estou aqui...
Não há orixá que dê jeito
Um sentimento não correspondido..
Vassalagem perdida nos becos
Na janela que não abrirei...