quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Meu depoimento no lançamento do livro Retratos da Garoupa de Fernanda Gringolin




Primeiramente gostaria de agradecer o convite da Fernanda estou lisojeada de participar de um momento familiar, artístico e emocionante.
Retratos da Garoupa é um rico trabalho de valorizar a memória e as marcas que carregamos dos nossos familiares. Reconhecimento de que nós somos portadores de histórias e de belas histórias.

A memória e a criação poética no meu caso que escrevo poemas falando sobre a minha experiência negra e tentando remeter a fragmentos da cidade que passei a minha infância são os meus alicerces na escrita.

Sou filha de um casal de baianos, de uma cidade da Bahia chamada Nova Soure. Nasci em São Paulo, mas fui morar nessa cidade com 2 anos de idade e passei toda a minha infância. Retornei a São Paulo com 13 anos.

Carrego muitas lembranças, o cajueiro, por exemplo, foi o meu fiel companheiro, meu avô na sua fazenda fez um balanço pra mim e era a minha diversão preferida. Quando as outras crianças chegavam era um brigueiro, pois eu sentia que era dona do balanço e do cajueiro.

Nas férias escolares do final do ano, em dezembro, época do cajueiro está frutoso e florido, a castanha era uma das moedas de troca, eu ia junto com a minha avó e a minha tia catar castanhas e cajus, com o dinheiro que eu vendia as castanhas comprava todo o meu material escolar do ano seguinte. A minha avó fazia um doce de caju em compota que sou apaixonada.
Em 2009, depois de 13 anos habitando a cidade de São Paulo, fui visitar a cidade da minha infância, muitas imagens mudaram, primeiro porque as crianças da minha idade também cresceram, os mais moços envelheceram e os muitos idosos concluiram o ciclo da vida.
A cidade que era o meu mundo na infância e no momento de retorno como eu tinha adquirido outras referências, as comparações foram inevitáveis. Eu tive a impressão que a cidade de Nova Soure encolheu, que as ruas ficaram estreitas, que a casa onde morei durante 11 anos ficou pequena. Até uma lagoa que tinha na fazenda dos meus avós parecia mais uma grande poça de água.
A parte mais triste deste retorno foi visitar a casa dos meus avós já falecidos há 6 anos. Visitei todos os parentes e amigos,mas deixei a fazenda por último. Na porteira lembrei que meu avô não estaria no cajueiro e a minha avó na beira do fogão, cozinhando duas porções mágicas. Comecei a chorar descontroladamente. Acho que a saudade é suportável, o que eu não aguentei foi ver que o que a minha avó cuidava que era suas plantas e flores já não existiam mais. Meu tio solteiro que mora na casa que foi dos meus avós, acredita que ele colocou um varal no meio da sala? Eu achei um absurso. Mas ele tentou fazer da mesma que meus avós fariam se eu os tivesse visitado antes. Fez galinha caipira no fogão de lenha, que ele não ligava há anos... Nossa quantas lenhas eu carreguei para abastecer aquela cozinha! Ele tirou coco do coqueiro, mangas, cajus, mas eu me alimentei de uma comida salgada banhada pelas minhas lágrimas.
As lembranças e as memórias elas são tão vivas na nossa vida que quando vamos rever no mundo real,elas perdem a proporção que tem dentro do nosso imaginário.
A forma que encontrei de manter essas lembranças e memórias da forma que elas estão impressas em mim, tem sido por meio das poesias e de textos que me teletransportam para estas lembranças e memórias. E para finalizar um poema.

Chamado

Ouço vozes aqui dentro
Vozearia, Gritaria
Identidades diversas
O aveso do meu eu, colcha de retalhos do nós
Ancestralidade clama
Para acendermos a chama.

Axé.
Elizandra Souza

Mais fotos do lançamento:

Fernanda e sua mãe...


Familiares e amigos de Fernanda

2 comentários:

Estímulo da produção de Literatura Periférica em meio a Juventude. disse...

Um convite especial pra uma Mulher especial:

Salve galera, do dia 21 de Novembro estaremos reunidos/as na Zona Leste, mais especificamente em Guaianases na Casa de Cultura dos/as Guaianás comemorando a finalização do Projeto Tenda Literária, financiado pelo Programa VAI da Prefeitura de São Paulo junto com uma porrada de gente envolvida na fomentação da Literatura Periférica e suas articulações.

Abaixo segue o cartaz do nosso evento e esperamos a presença de vocês lá pra se alimentarem de um grande e variado cardápio de livros, pessoas e um caldinho que será preparado pra todos e todas que estiverem, ou não, no evento.

A partir das 10:00hs da manhã estaremos lá, pra maiores informações acessem nosso blog:

http://tenda-literaria.blogspot.com/

Abracios, fui.

COLETIVO TENDA LITERÁRIA.

A disse...

Que lindo texto Eli...