Sou dois mundos.
Isso já foi acordado.
Uma eu sou leve, alegre, amiga, disposta...
Agora a minha outra eu,
aquela que raras pessoas conhecem,
aquela que várias vezes elouquece
e desabafa nos textos verdades inquestionáveis,
vontades embaraçosas, segredos só seus;
essa já não é tão feliz.
Não, ela não é feliz.
Não na maneira convencional estabelecida.
Não no senso comum.
Ela é qualquer outra coisa menos sorriso,
menos fachada, menos ombro amigo.
Essa é sozinha, mas às vezes ela sorri, sim.
Sorri quando coloca pra fora aquelas bobagens
que todos devem pensar,
mas não chegam a verbalizar.
Surtar.
A minha eu desenquadrada se dá ao luxo de surtar.
Não se acanha com possíveis pensamentos
e nem pensa em servir de exemplo pra ninguém.
Que se dane ninguém!
Ela é livre, assim como a minha eu
tão feliz gostaria de ser.
A liberdade inexistente sem a limitação necessária
pra viver em sociedade.
Às vezes, como hoje, por exemplo,
bate uma tristeza tão grande,
uma vontade tão desesperada de chorar
e gritar e uivar as minhas penas...
Mas não dá. Não posso assustar os que me rodeiam.
Não tem ninguém aqui que possa me consolar
sem me cobrar a alegria que tanto parece comigo.
Existem só essas brigas de eus,
onde não importa quem ganhe,
eu sempre perco.
Autora: Mel Adún (poeta que admiro e quero que tenha sempre inspirações que me desnudem e diga de mim, coisas que nem eu mesma consegui ver).
Fonte: Cadernos Negros 31.